domingo, 31 de outubro de 2010

Pobreza extrema

Quando nós dizemos que em Portugal há mais de 18% de pobres, falamos de uma pobreza relativa ao rendimento das pessoas em Portugal. Mas todos percebemos que a partir de uma certa altura as pessoas vivem numa situação de pobreza tão severa que independentemente dos outros à sua volta terem algum dinheiro ou terem tão pouco como elas, não é possível subsistir com esse nível de rendimentos. Por isso, para falar no exemplo limite, morrem de fome ou de doenças ligadas à fome cerca de 24.000 pessoas por dia.
O Banco Mundial situou a pobreza extrema num rendimento abaixo de 1,25 dólares dia, ainda menos que 1 euro por dia. São milhões de pessoas a viverem assim. O pior, é que a falar verdade nem um dólar é de facto, mas sim aquilo a que se chama "dólar paridade de poder de compra", isto é, essas pessoas, nos seus países e com o dinheiro dos seus países podem comprar por dia (casa, alimentação, vestuário, transportes, alfaias, ... tudo o que é preciso para viver)aquilo que comprariam nos Estados Unidos com um dólar... No caso, com um dólar e vinte e cinco cêntimos. Ou, dizendo de outro modo, para uma pessoa que viva em Portugal a pobreza extrema é viver com menos de um euro por dia, para fazer face a todas as despesas da existência, e sem apoio do Estado na saúde, educação, etc...

Testemunho

Comecei a consumir com 20 anos, agora tenho 43 anos. Já fumava haxixe, mas foi com amigos que comecei a injectar heroína, queria saber qual era a sensação. Consumi heroína durante 2 anos e depois parei durante um mês. Depois voltei a consumir heroína, mas só fumada até hoje.

Não sei explicar muito bem porque motivo entrei no mundo das drogas mas eu praticamente fui criado com a minha mãe, ela separou-se muito cedo. Embora trabalhasse, não tínhamos muitas possibilidades económicas e acabei por sair da escola bastante cedo para ir trabalhar.

Hoje vivo numa casa abandonada. Embora tenha constituído família, tenho 2 filhos, as coisas também não correram muito bem. A minha esposa sabia que consumia, mas quando fui preso pela segunda vez, ela quis acabar tudo.

Continuo a visitar os meus filhos e a manter contacto, mas vivo a minha vida na rua.
Vivo em más condições, pois não há o mínimo de conforto, não há água, não há luz, … o que me custa mais é passar o inverno porque passo algum frio.

Quando sou chamado para uma oferta de emprego, acabo por ser excluído porque não tenho a escolaridade obrigatória, tenho a penas o 6.º ano incompleto.

Neste momento o que mais gostaria, era ter uma casa própria e gostava de deixar totalmente as drogas. Se conseguir vir a ter uma casa tenho a certeza que a minha vida irá mudar!

R, 43 anos (Agosto 2010)

domingo, 24 de outubro de 2010

"Penso que os que fazem o pão deviam comer"



O POVO

Lembro-me daquele homem e não se passaram
mais do que dois séculos desde que o vi,
não andou de cavalo nem de carroça:
descalço
anulou
as distâncias
e não levava espada nem armadura,
apenas redes ao ombro,
machado ou martelo ou pá,
e nunca espancou o seu semelhante:
a sua luta foi contra a água ou a terra,
contra o trigo para que houvesse pão,
contra a árvore gigante para que desse lenha,
contra os muros para abrir as portas,
contra a areia construindo muros
e contra o mar para o fazer parir.

Conheci-o e não se me apaga da memória.

Caíram em bocados as carroças,
a guerra destruiu portas e paredes,
a cidade tornou-se num punhado de cinzas,
transformaram-se em pó todas as roupas,
mas para mim ele subsiste ainda,
sobrevive na areia,
quando antes parecia ser ele
o menos recordado.

No suceder de gerações e gerações
foi por vezes meu pai ou meu parente
ou apenas, sendo ele ou não,
aquele que não voltou à sua casa
porque a água ou a terra o engoliram
ou uma máquina ou uma árvore o deceparam
ou foi aquele enlutado carpinteiro
que ia atrás do caixão, sem lágrimas,
ou alguém que não tinha nome,
que se chamava metal ou madeira,
para quem os outros olharam com indiferença
vendo o formigueiro
sem olharem para a formiga
e quando os seus pés não se mexeram,
pois o pobre de tão cansado tinha morrido,
não viram nunca que o não viam:
outros pés havia já nos lugares onde estivera.

Os outros pés eram dele próprio,
as outras mãos também,
o homem renovava-se:
quando parecia já ultrapassado
era novamente ele,
ali estava outra vez cavando a terra,
cortando pano, mas sem camisa,
ali estava e não estava, como dantes,
tinha partido e estava de novo ali,
e como nunca teve cemitério,
nem campa, nem o seu nome foi gravado
sobre a pedra que britou suando,
ninguém sabia jamais quando chegava
nem soube nunca quando estava morrendo,
de tal maneira que só quando o pobre pôde
ressuscitou outra vez sem ser notado.

Era o homem certamente, sem herança,
sem vaca, sem bandeira,
e não se diferenciava dos outros,
os outros que eram ele,
visto de cima era cinzento como o subsolo,
como o couro era pardo,
colhendo trigo era amarelo,
no fundo da mina era negro,
no era cor de pedra no castelo,
barco pesqueiro era cor de atum
e cor de cavalo na planície:
como poderia alguém saber ao certo
se era o inseparável, o elemento,
terra, carvão ou mar vestido de homem?

E onde viveu crescia
tudo quanto o homem tocava:
a pedra hostil,
quebrada
pelas suas mãos,
tornava-se ordenada
e uma a uma formaram
a recta claridade do edifício,
com as suas mãos fez o pão,
pôs os comboios em movimento,
povoaram-se de aldeias as distâncias,
outros homens nasceram,
chegaram as abelhas,
e, porque o homem cria e se multiplica,
a primavera foi em direcção ao mercado
por entre padarias e pombas.

O pai dos pães foi esquecido,
ele que traçou a terra, pisando
e abrindo regos, acarretando areia,
quando tudo ficou pronto já não existia,
a sua existência ofertava-a, isso era tudo.
Foi trabalhar noutros lugares, e depois
morrer rolando lentamente
como um seixo do rio:
arrastado pelas águas levou-o a morte.

Eu, que o conheci, vi-o descer
até ser somente o que deixava:
ruas que apenas pôde conhecer,
casas que jamais habitaria.

E volto a vê-lo, e espero cada dia.
Vejo-o no seu caixão, ressuscitado.

Distingo-o entre aqueles
que são seus semelhantes
e parece-me que não pode ser,
que assim não chegamos a lado nenhum,
que dessa forma não se conquista a glória.

Eu penso que este homem
devia estar num trono, bem seguro e coroado.

Penso que os que fizeram tantas coisas
deviam ser senhores de todas as coisas.
E os que fazem o pão deviam comer!

E deviam ter luz os que trabalham nas minas!

Mas chega de tantas coisas sombrias!

Chega de pálidos desaparecidos!

Nem mais um homem que passe sem reinar.

Nem uma só mulher sem o seu diadema.

Para todas as mãos luvas de ouro.

Frutos de sol para toda a escuridão!

Eu conheci aquele homem e quando pude,
quando tive olhos para olhar
e voz para falar
procurei-o entre os campos, e disse-lhe
apertando-lhe um braço que não se desfizera ainda:

«Partirão todos, mas tu ficarás vivendo.

Tu acendeste a vida.
Tu criaste o que era teu.»

Por isso ninguém se enfade quando
pareço que estou sozinho e não estou sozinho,
quando não estou com ninguém e falo para todos:

Alguém me está escutando e não dão por isso,
mas aqueles que eu canto e conhecem a razão
esses continuarão a nascer e povoarão o mundo.
(P. Neruda)

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Notícias do Verde Pino


O Projecto está mais activo do que nunca! Esta semana estivemos no Seixo da Beira, com os párocos locais, presidentes de 4 Centros nossos parceiros, a programar worksophs para esta zona; Promovemos um workshop em Alvaiázere; recebemos documentação de alguns ateliers (ver na foto, utentes do Centro de ATL de Oliveira do Hospital 2.3 + Secundária levaram objectos feitos num atelier do Projecto aos idosos do Centro de Dia de S. Paio de Gramaços; tivemos a exposição "Retalhos de outras vidas" nas duas escolas da Lousã (EB 2.3. e Secundária); fizemos entrevistas para a "Sebenta" Pobreza e Desempobrecimento...
A Exposição "Retalhos de outras Vidas", com fotos em tela por alunos dos Centros de ATL de diversos concelhos da área do Projecto, está a motivar o interesse generalizado das pessoas e instituições, pelo que a sua impressão irá ser duplicada, para conseguirmos responder a todas as solicitações e com mais tempo de permanência.

domingo, 17 de outubro de 2010

Dia Mundial Para a Erradicação da Pobreza

Hoje, 17 de Outubro, Dia Mundial para a Erradicação da Pobreza, sucedem-se um pouco por todos os lados múltiplas iniciativas relacionadas com a pobreza.
É positivo que assim seja; felizmente, muitas pessoas e organizações do nosso mundo e do nosso tempo mantêm e apuram uma consciência de combate à pobreza.
Mas iniciativas pontuais estão muito longe de chegarem para um combate efectivo, se não se traduzirem em mudanças permanentes no estilo de vida. As dezenas de caminhadas contra a pobreza que hoje se fazem em Portugal e um pouco por todo o mundo ficam apenas espectáculo se não se traduzirem na grande caminhada de conversão para um estilo de vida mais sóbrio, mais solidário, menos consumista e menos elitista.
É pela causa desta conversão dos estilos de vida que o Verde Pino se fez Projecto!

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

"Retalhos de outras vidas"

Começou hoje a itinerância da Exposição fotográfica "Retalhos de outras vidas", uma das actividades do projecto Verde Pino, com a qual se pretendia sensibilizar tanto o conjunto de pessoas que se envolveram na sua promoção, como as pessoas que a visitem na sua fase final.
Mais de uma dezena de centros de Actividades de Tempos Livres aderiram à iniciativa, tendo tido formação em fotografia e revelação e tirando as fotografias. Foram aceites fotografias em formato papel (reveladas nos Centros) e em formato digital.
As fotos seleccionadas foram depois impressas em 8 roll-up, de 2 metros de altura por 80 centímetros de largura, o que permite uma deslocação fácil da exposição de terra para terra. A exposição será feita em parceria com algumas escolas e outras estruturas locais, conforme os casos. Irá visitar até final Dezembro os concelhos de Miranda do Corvo, Lousã, Vila Nova de Poaires, Alvaiázere, Arganil, Tábua, Oliveira do Hospital, Penela, Ansião e Pampilhosa da Serra, com estadia de 1 semana em cada um destes concelhos. Depois de Dezembro poderá continuar a correr outras terras ou também equipamentos.
Hoje mesmo a Exposição teve a sua primeira apresentação pública, na sede do Agrupamento de Escolas Férrer Correira, Miranda do Corvo, no Senhor da Serra.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Visite a Cáritas na Fun Zone Continente 360º

A propósito dos dois concertos dos U2 em Coimbra, este fim-de-semana, a empresa municipal Turismo de Coimbra e a Feelings 4 All, com o patrocínio do hipermercado Continente, promovem um evento na cidade, de 1 a 4 de Outubro, a Fun Zone Continente 360º, que entre múltiplas iniciativas contempla também um espaço de solidariedade a favor da Cáritas Diocesana de Coimbra.
Na Praça da Canção, onde ocorre o evento, vão haver concertos, projecções de alguns concertos dos U2, dj's, restauração... A entrada é livre.
Se tiver um bocadinho e quiser ir ver o ambiente, não se esqueça de visitar a nossa "tenda", onde teremos todo o prazer em o/a acolher. Além de poder ver a nossa exposição, e provar os nossos petiscos, poderá ainda exercer a sua solidariedade a favor da construção de uma unidade de saúde materno-infantil no Haiti. ...porque vale a pena acreditar!